quarta-feira, 15 de junho de 2011

Rotina inacabada.

                                                                               
A luz do sol invadia seu quarto. Nem as cortinas ofuscavam aquela luz. Apesar da claridade do sol, seu quarto continuava frio. Ela abriu os olhos com dificuldade e aos poucos ia se acostumando com a luz. Sentia a ressaca da noite passada. Lentamente ia se lembrando do sonho que teve. Fazia tempo que não sonhava com ele. Fazia tempo que não se lembrava dele. Fazia tempo que não sentia nada por ele, mas aquele sonho acabou com o jejum por ele. Aquele sonho fez ela perceber o que ela tinha se tornado sem ele.
Colocou o cd do Duran Duran no som e ficou ouvindo repetitivamente a mesma música e cantava alto o refrão Who do you need, Who do you Love when you come undone?
Já havia mais de sete meses desde a última conversa, gritaria, baixaria e do término de tudo aquilo e ela, aparentemente, superou bem o luto da perda dele. Entretanto, havia algo que a deixou desnorteada de tudo em volta dela. Ela não era mais a mesma.
Depois de acordar e de se recuperar de suas ressacas matinais, sua companhia eram Caio Fernando Abreu, Clarisse Lispector e Machado de Assis.
À noite se tornaram mais frias e longas naquele inverno e ela as passava na varanda, bebendo uma garrafa de vinho qualquer e fumando um maço de cigarros. Ficava bêbada, ia para o banheiro vomitar e depois ia para a cama dormir.
Ela acordava com a claridade da luz do sol que entrava pela janela e sabia que na noite anterior não havia só vomitado o vinho. Ela colocava para fora também toda a sua melancolia, seus fracassos, suas amarguras e suas magoas que estavam presas dentro de sua alma e não saiam de outro jeito.
Uma noite, enquanto bebia o vinho e fumava um cigarro, ela começou a pensar em ligar para ele e dizer para ele como ele arruinou a vida dela. Depois de mais um gole de vinho, sentiu uma súbita raiva porque percebeu que quem estragou até então a vida dela foi ela mesmo. O pior é que foi tudo em vão. Amassou o cigarro e acendeu outro em seguida. Sentia a necessidade de culpar alguém pela vida medíocre que levava. Mas não havia mais ninguém a culpar a não ser ela mesma e essa culpa estava sufocando-a.
Ela ficava se perguntando se ele estaria feliz agora e sentia inveja daquilo, pois era o que ela mais desejava naquele momento. Ela não se sentia triste, mas também não se sentia feliz. A única coisa que ela sentia há um bom tempo era indiferença. Indiferença de tudo e de todos. Nada havia sentido algum.
Ela conseguia se lembrar de quando era uma criança feliz e tinha sonhos e esperanças e não entendia o porquê de todo esse sentimento bom ter simplesmente evaporado de sua vida assim, sem mais, sem menos.
Sua mãe nunca a amou o suficiente. O pai dela nunca manteve contato com ela. Mas isso não a impediu de ser uma criança feliz. Ela criou o seu próprio mundo e nele ela vivia feliz e esperançosa de que a vida era melhor do que ela imaginava. Isso a manteve feliz por muito tempo. Entretanto, com o tempo a mágica foi passando e o que sobrou foi o preto e branco, a falta de sentido. Se a vida é colorida, então ela era transparente.
Assim ela vivia seus dias e noites, numa espécie de rotina inacabada, incontrolável, que nem ela se dava conta.
Tinha uma vida assim, começada, mas não saia dessa rotina inacabável. Era uma vida sem sentido. O desespero pelo sentido não a levava a lugar nenhum e jamais iria levar. A vida tem dessas coisas. Ela acontece sem nada ser esperado ou desesperado.

Por Jéssica


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